06 outubro 2006

As armas secretas da música

Todo mundo tem um disco especial, um LP de vinil (também conhecido como bolacha), que trata como se fosse a coisa mais preciosa do mundo

George Bush pode não ter encontrado as tais armas de destruição em massa no Iraque. Mas o jornal britânico The Guardian pediu a 49 músicos, produtores e escritores, que revelassem suas armas secretas, suas preciosidades musicais guardadas à sete chaves. O resultado, uma compilação publicada na edição de 6 de outubro de 2006, ficou tão boa, que aqui reproduzo o link. É uma coleção de 49 raridades que raramente chegaram à parada das dez mais da Billboard. Mas gente como Chrissie Hynde (ex-Pretenders), Nelly Furtado, e Roger McGuinn, ouviram essas coisas até furar o vinil. Como todo mundo tem um álbum assim, o Guardian deixou o número 50 por conta dos leitores. Quem enviar a melhor dica, ganha 500 libras em CDs (o equivalente a 1.000 dólares, ou 2.400 reais). Pode parecer muito no Brasil, mas é bom lembrar que na Inglaterra um CD está por volta de 20 libras.

Richard Hawley, por exemplo, revelou que sua bolacha preferida é a Missa em fá menor, disco de 1968, da banda americana "Electric Prunes" ("Ameixas elétricas"), que ficou conhecida pela faixa "Kyrie Eleison" da trilha sonora do filme Easy Rider (Sem destino), uma versão bem psicodélica da milenar (ou seria bilenar?) missa católica.

Confesso que é uma das minhas bolachas favoritas também. Tenho o vinil da trilha desde tempos imemoriais. Os Electric Prunes começam cantando a missa como um coro beneditino, muito afinado, cantando à capela. Mas quando você pensa que pegou o disco errado, que em vez do Easy Rider você pegou foi a missa de domingo do Padre Marcelo, eis que surge um trio de guitarra, baixo e bateria quebrando tudo. Uma guitarra lisérgica lembra Jimi Hendrix. Soa totalmente surrealista ainda hoje. Imagine em 1969, quando o filme foi lançado.

A trilha toda do Easy Rider é muito boa: inclui, entre outros, "If Six Was Nine", faixa do álbum Axis, Bold as Love, do Jimi Hendrix, "Born to be Wild", e "The Pusher" do Steppenwolf, o próprio Roger McGuinn (ex-Byrds), e mais uma porção de gente boa que sumiu desde que o filme foi lançado, ainda no milênio passado. Ouço sempre. Ou ouvia, até quebrar o toca-disco. Mas recentemente encontrei o CD no quarto do filho adolescente de uma ex-namorada. E claro, copiei para o meu iPod.

Já a cantora canadense de ascendência portuguesa Nelly Furtado mencionou o disco do Tom Zé, de 1998, Com defeito de fabricação, como melhor exemplo de world music.

O editor da seção Rock&pop do Guardian é bom nestas coisas. Na edição de 16 de julho ele já tinha publicado uma matéria especial, intitulada 50 álbuns que mudaram a música, uma compilação de discos que fizeram a histório do rock e do pop.

Juntas, as duas matérias valem por uma verdadeira enciclopédia, com uma preciosa seleção de clássicos e raridades do universo pop. O cara é o próprio Diderot do rock & roll.

Confesso que estou com vontade de mandar a minha sugestão, o meu álbum secreto preferido, e ver se faturo os CDs. É o disco da Zizi Possi onde ela regravou Nunca, o grande clássico de Lupicínio Rodrigues, o grande mestre da dor de cotovelo, e que se não me falha a memória, é mais ou menos assim:

Nunca, nem que o mundo caia sobre mim
nem se Deus mandar, nem mesmo assim
as pases contigo, farei

Nunca, quando a gente perde uma ilusão
Tem de sepultar o coração
Como eu sepultei

Saudade, diga a esta moça por favor
Como foi sincero o meu amor
Como eu a adorei
Tempos atrás

Saudade, não esqueça também de dizer
Que é ela que me faz adormecer
Pra que eu viva em paz


Ouço sempre, principalmente quando brigo com uma namorada. Claro, já está todo riscado. Do jeito que as coisas andam, acho melhor comprar logo o CD.


As armas secretas do rock

50 álbuns que mudaram a música